terça-feira, 20 de dezembro de 2016

A Palavra e a Tradição

A Bíblia é contra a tradição?

       Seguimos a Bíblia ou a tradição?

Falar em Tradição em um ambiente pós-moderno é ser taxado de “retrogrado”, “conservador”, “arcaico”, “intelectualmente fraco” (que fique claro que não estou falando de política). Se mudarmos o foco para dentro do espaço eclesiástico, talvez os adjetivos mudem, mas o tom pejorativo certamente estará presente. Agora, será que tais adjetivações fazem jus ao que se posicionem em favor da Tradição? A Bíblia tem algo a nos dizer sobre a como lidarmos com a tradição? Bom, essa será a tentativa das próximas linhas.
Quando pensamos em tradição duas coisas vem à mente do povo evangélico. A primeira é o texto em de Mc 7.8-9, que diz: Vocês negligenciam os mandamentos de Deus e se apegam às tradições dos homens". E disse-lhes: "Vocês estão sempre encontrando uma boa maneira para pôr de lado os mandamentos de Deus, a fim de obedecer às suas tradições! A conclusão tirada logo em seguida é que a tradição, portanto, é ruim. A segunda coisa que vem a memória é que a Igreja Católica se apega a tradição para construir a sua teologia, logo, a tradição é ruim também.
Agora, será que o texto de Mc 7.8-9 está “demonizando” a tradição? Será que não existe outras formas de pensar e viver a tradição? O que fazer diante desse quadro?

Olhando para a Escritura
Antes de verificarmos o que a Bíblia diz sobre a tradição, cabe um esclarecimento do que a palavra em si significa. Tradição é uma palavra com origem no termo em latim traditio, que significa "entregar" ou "passar adiante". A tradição é a transmissão de costumescomportamentosmemórias, rumores, crençaslendas, para pessoas de uma comunidade, sendo que os elementos transmitidos passam a fazer parte da cultura1. Com o significado do termo esclarecido vamos aos textos.
O primeiro texto é o de Mc 7.1-13. No texto, Jesus é interpelado pelos fariseus pelo fato de seus discípulos estarem comendo sem lavar as mãos e, com isso, ferindo uma tradição religiosa de seu povo (isso fica evidente pelo termo purificação no texto, termo comum nos atos de lavagem rituais). A resposta de Jesus aos fariseus vem em tom de crítica, Vocês negligenciam os mandamentos de Deus e se apegam às tradições dos homens". No decorrer do texto vemos Jesus criticando os fariseus por apegarem-se a tradição chamada corbã, que era a dedicação de todos os seus bens a “obra de Deus”. Com todos os bens dedicados (que eles continuavam a usufruir) eles não poderiam utiliza-los para ajudar a família. Então, Jesus criticou a tradição ou não?
Em primeiro lugar vale destacar que os discípulos de Jesus feriam uma tradição (purificação) que não estava baseada nas escrituras, mas em formulações humanas. Jesus jamais negou que seus discípulos tivessem rompido com as tradições, mas justificou o fato dizendo que essas tradições pertenciam somente aos homens2.
Em segundo lugar a crítica de Jesus está vinculada ao abando da orientação e direção da Palavra. De acordo com Jesus, aqueles que viviam segundo a tradição dos anciões: “negligenciam os mandamentos de Deus” (v.8); “pôr de lado os mandamentos de Deus” (v.9); “anulam a Palavra de Deus” (v.13). Como eles colocaram os seus costumes em lugar da verdadeira intenção da lei, Jesus os chama de “hipócritas”3. A crítica de Jesus não é a tradição em si, mas no abando no da Palavra de Deus como gabarito que orienta a vida e a tradição.
O segundo texto para nossa reflexão é o texto de 1 Co 11.23, pois recebi do Senhor o que também lhes entreguei. O trecho que vai do verso 17 ao verso 34 do capítulo 11, Paulo começa a advertir a igreja de Corinto pela sua má conduta na ceia do Senhor. Ao introduzir a seção anterior (1Co 11.1-16), ele pudera elogiar os coríntios pela maneira como eles guardavam “as tradições” (Eu os elogio por se lembrarem de mim em tudo e por se apegarem às tradições, exatamente como eu as transmiti a vocês.
1 Co 11.2). Quando passa a tratar do serviço da Comunhão, vê que não pode louvá-los4 (Entretanto, nisto que lhes vou dizer não os elogio, pois as reuniões de vocês mais fazem mal do que bem. 1 Cor 11.17). A igreja estava sendo fiel na observância de algumas tradições e na de outras não. Mas em que estava o erro da igreja? Só estava em ferir uma tradição?
Para tentar responder a essa pergunta gostaria de destacar um pequeno trecho da perícope, Pois recebi do Senhor (1 Coríntios 11.23). Paulo baseia a tradição de uma ceia reverente e respeitosa, a uma tradição que havia recebido do Senhor Jesus Cristo. A tradição, como transmissão de conhecimento ou ordenança, vinha do próprio Jesus, ou seja, estava baseada na autoridade divina. A tradição para Paulo não era nociva quando em si ela transmitia uma verdade Bíblica.

Conclusão
Portanto, a tradição em si não é algo nocivo e pecaminoso. O perigo está em o que ela está refletindo. Se estiver refletindo um princípio da Escritura ela será edificante e proveitosa para a nossa vida, mas se ela caminhar diametralmente oposta a Palavra de Deus ela deve ser rejeitada. Concluo com uma ilustração utilizada por Kevin J. Vanhoozer sobre esse assunto. A Bíblia é o sol que ilumina a nossa caminhada, a tradição é a lua, que não tem luz própria, mas é capaz de iluminar a caminhada nas noites mais escuras quando ela reflete a luz do sol (Escritura)5.



1Disponível em: <https://www.significados.com.br/tradicao/> Acesso em: 16 de dezembro de 2016.
2D. A. Carson, Comentário Bíblico Vida Nova (São Paulo: Vida Nova, 2009), p. 1447.
3Dewey M. Mulholland, Introdução e comentário, Marcos (São Paulo: Vida Nova, 1999), p. 117.
4Leon Morris, Introdução e comentário, 1Coríntios (São Paulo: Vida Nova, 1981), p. 126.

5Kevin J. Vanhoozer, Sola Scriptura e o papel da tradição cristã. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=PFSCit9W_o0> Acesso em: 16 de dezembro de 2016.

quinta-feira, 8 de dezembro de 2016

Salmo 121


Tema: Os perigos incertos da caminhada, mas o cuido certo do Senhor.

     O salmista do salmo 121 está rumando para Jerusalém para a observância das principais festas judaicas (Pascoa, Pentecoste e Tabernáculos). Parece haver uma progressão nesse trecho do saltério. Pois o salmo 120, fala da aflição de morar em meio a um povo ímpio de lábios mentirosos, ou seja, distante de sua amada Jerusalém. Já no salmo 121, dá a entender que o peregrino saiu da sua cidade de habitação e está rumando para o monte Sião.
     Agora a aflição do salmista ganha novos contornos. Antes, eram os ímpios que o cercavam, com seus lábios maliciosos, que o afligiam. Mas agora, a aflição surge das incertezas e perigos do caminho. Ele sai de um ambiente hostil e caminham por lugares inseguros.
       Quando no v.1 ele fala, Elevo os olhos para os montes: de onde me virá o socorro? É uma demonstração clara das incertezas e do medo que sobrevêm na caminhada. No v. 6 ele diz, de dia não te molestará o sol, nem a noite, a lua. São alguns dos possíveis perigos do caminho. Um caminho difícil, marcado pelo calor escaldante do dia e o frio intenso da noite.
     Outro fator de grande risco enfrentados pelos peregrinos que rumavam para Jerusalém, era os riscos de saques e assaltos no percurso. Cada vale, cada planície, cada trecho percorrido era marcado pela incerteza da insegurança do percurso.
   Mas é diante da incerteza da vida e da jornada que o salmista busca a certeza e segurança da proteção divina. E é sobre isso que iremos refletir.

1.     A segurança está no Deus do universo. V.2. O meu socorro vem do Senhor, que fez o céu e a terra.
   Os montes no verso primeiro apontavam para o lugar que eram erigidos os altares de ídolos. No contexto da época do salmo, provavelmente altares levantados aos baalins. 
    O salmista diante da incerteza e insegurança da jornada, ele decide confiar em Deus que fez os céus e a terra e não em ídolos. O salmista recorre ao Deus criador, ao grande Senhor do universo. O medo da insegurança do percurso é dissipado quando ele lembra que o seu Deus é o Deus do universo, o Todo Poderoso.Não há medo e nem insegurança que permanece diante da certeza de servir ao Senhor do universo.
    Imaginem a grandeza do universo. A esfera observável pode parecer ter quase 28 bilhões de anos-luz de diâmetro, ela é muito maior. Os cientistas sabem que o universo está se expandindo. Assim, enquanto os cientistas podem ver um local que estava a 13,8 bilhões de anos-luz da Terra, no momento do Big Bang, o universo continuou a se expandir ao longo de sua vida. Hoje, esse mesmo ponto está a 46 bilhões de anos-luz de distância, fazendo com que o diâmetro do universo observável seja de uma esfera em torno de 92 bilhões de anos-luz. Aí lembramos que o Deus que contemplamos, o Deus do nosso socorro é o Senhor que criou tudo isso.
    Quando estivermos com medo do percurso ou inseguros com os nossos próximos passos, lembremos que o nosso Senhor é o Deus do Universo, é o Deus criador de tudo, ou seja, o Todo Poderoso.
     Aquietemos os nossos corações na certeza do tamanho do poder do nosso Deus.
 
2.    A segurança está no zelo de Deus. V. 3-4. Ele não permitirá que teus pés vacilem; não dormitará aquele que te guarda. É cero que não dormita, nem dorme o guarda de Israel.

    A segunda coisa que faz o salmista descansar do medo e insegurança do percurso é o zelo que ele sabe que Deus tem por sua vida.
    Os versos 3 e 4 parecem soar como uma resposta dada por terceiros a aflição do salmista, Ele não permitirá que teus pés vacilem; não dormitará aquele que te guarda. É cero que não dormita, nem dorme o guarda de Israel. O medo e insegurança do salmista é confrontado pela afirmação do cuidado zeloso de Deus. A figura aqui é a de um vigia atencioso, que a todo instante está atento a qualquer movimentação suspeita. O Senhor é zeloso, ciumento, pelos seus.
    O medo e a insegurança se dissipam quando sabemos que o Senhor do universo é zeloso, ciumento, por sua noiva. O Senhor cuida de maneira zelosa de seus peregrinos no decorrer da jornada. Ele não dorme e nem cochila em sua vigília zelosa.
    Portanto, descasemos na certeza de que o Deus do universo, a quem nós servimos, é um Deus zeloso por nossas vidas em toda a peregrinação.

3.    A segurança está na presença de Deus. V. 5b. o Senhor é a tua sombra a tua direita.
   
     A terceira coisa que dissipa o pavor e a inquietação do peregrino é a pessoalidade de Deus.
    O salmista se vale de uma figura muito peculiar para demonstrar a pessoalidade de Deus em sua jornada, a da sombra. Para o salmista o seu Deus é o Deus do universo, é o Deus que vigia zelosamente, e também, o Deus pessoal. A figura de uma sombra traz a ideia de uma presença sempre constante e de pessoalidade, cada uma tem a sua. O Senhor é um Deus preocupado com a pessoalidade de cada um. Ele é o Deus preocupado com nossas particularidades.
    O Senhor Jesus deixou isso claro sobre a sua presença constante nas nossas vidas. Ele disse, E eis que estou convosco todos os dias até à consumação do século (Mt 28.20); e, E eu rogarei ao Pai, e ele vos dará outro Consolador, a fim de que esteja para sempre convosco, o Espírito da verdade, que o mundo não pode receber, porque não o vê, nem o conhece; vós o conheceis, porque ele habita convosco e estará em vós (Jo.14.16).
    A inseguridade e o amedrontamento do percurso devem desvanecer-se diante de um Deus tão pessoal. Cada um tem as dificuldades particulares de sua caminhada. É verdade que há perigos comuns, mas também é verdade que cada um tem as suas particularidades ao longo da jornada. Diante disso, o que nos conforta e encoraja é a certeza de termos um Deus que conhece cada peculiaridade nossa e também está presente em cada uma, como uma sobra, o tempo todo.
    Portanto, descasemos no fato de termos um Deus que é o Senhor do universo, que nos guarda com um vigia zeloso e nos conhece e nos acompanha com sobra.

4.    A segurança está no Deus da minha história. V. 8. O Senhor guardará a tua saída e a tua entrada, desde agora e para sempre.
     A quarta coisa que suprimem o medo e a insegurança é a certeza que o salmista tem que o seu Deus é o Deus de sua história.
    Durante a sua jornada rumo a Jerusalém o salmista está cercado da insegurança do caminho. Talvez perguntando, “como será o meu amanhã”? Mas ao entoar o salmo ele se depara com o verso 8 que diz, O Senhor guardará a tua saída e a tua entrada, desde agora e para sempre. O Senhor de sua vida é o Deus de todo o seu percurso, desde sua saída, início da peregrinação, até sua chegada, na Jerusalém. Ele lembra que sua vida não é fruto do acaso ou das circunstancias. Mas sua vida está nas mãos do Senhor de sua história. O Senhor do universo é o Senhor de nossa história.
    Devemos descansar na certeza de que servimos e adoramos ao Senhor de nossa história. A nossa vida está nas mãos de nosso Senhor. Nas palavras de Jesus, Eu lhes dou a vida eterna; jamais perecerão, e ninguém as arrebatará da minha mão. Aquilo que meu Pai me deu é maior do que tudo; e da mão do Pai ninguém pode arrebatar. Eu e o Pai somos um. (João 10.28-30).
   Descansemos na certeza de quem ninguém pode nos arrebatar das mãos do Pai. Nada, nem destino, nem acaso e nem circunstancias.

Conclusão
Aquietemos os nossos corações na certeza que o Deus a quem servimos é o Deus do universo, que tem um olhar de um vigia zeloso e atento a todas as nossas particularidades do percurso, que também é o Deus da nossa história.

Soli Deo gloria!

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

  • Bíblia Sagrada Almeida Século 21: Antigo e Novo Testamento / [coordenação das revisões exegética e de estilo da Bíblia Almeida Século 21 - Luiz Alberto Sayão]. São Paulo: Vida Nova, 2008.
  • Bíblia Shedd; Traduzida em português por João Ferreira de Almeida. - 2. ed. rev. e atual. no Brasil. - São Paulo: Vida Nova; Barueri: Sociedade Bíblica do Brasil, 1997.
  • CARSON, D. A. Comentário bíblico: Vida Nova, São Paulo: Vida Nova, 2009.
  • RADMACHER, Earl; ALLEN, Ronald B.; HOUSE, H. Wayne. O Novo Comentário Bíblico: Antigo Testamento, Rio de Janeiro: Editora Central Gospel, 2010.

domingo, 21 de agosto de 2016

Habacuque 3

Habacuque 3.1-19
Tema: Do lamento ao avivamento.

Introdução: Ao longo desses três encontros temos estudado o livro de Habacuque e sua luta com Deus. Habacuque estava extremamente triste com a realidade de seu povo. Com a perversidade, com a injustiça e a imobilidade de Deus.

Vimos na primeira reflexão como Habacuque, por causa de leitura social, estava indignado. O povo estava vivendo de maneira corrupta aos padrões divinos. Havia toda sorte de injustiça e perversidade. Os mais fracos eram penosamente subjugados pelos mais forte. Na leitura que o profeta fazia da situação, Deus estava indiferente a tudo.

Isso fez ele dirigir uma pergunta em forma de lamento a Deus, questionando essa passividade divina. Só que a resposta não foi de seu agrado, pois descobriu que Deus não estava indiferente e exerceria juízo. Não da forma esperada pelo profeta, pois, o instrumento de juízo seria os caldeus, povo rebelde e idolatra que dominava o senário político da época.

Depois dessa resposta inesperada Habacuque volta a lamentar, agora pelo instrumento que Deus usaria para punir o povo da aliança. A resposta de Deus ao profeta é que a Babilônia também seria punida por sua crueldade e idolatria e que o justo viveria por sua fé/fidelidade a Deus.

Depois dessa teodiceia, a postura do profeta se modifica. É transformada do lamento ao hino de louvor, de desesperança à esperança. No final do livro do profeta Habacuque, vemos um belo hino composto pelo profeta, depois de compreender a ação de Deus na história banhada por seu amor.

Mas devido ao tamanho do texto e o pouco tempo que temos para dar continuidade ao estudo do mesmo, a parte a ser destacada serão os versos um e dois. Onde vemos o profeta na esperança de um avivamento.

1.     O avivamento não é produzido pelo povo, mas é obra de Deus. (Ó Senhor, aviva sua obra. Hb 2.2b)
Na sua oração em forma de Hino, Habacuque se rende à vontade divina e expressa isso clamando por um avivamento. Habacuque após dizer que, agora, conhecendo Deus melhor e seus feitos, pede pela contínua presença ativa de Deus no meio de seu povo.

Depois de perceber que a realidade que ele vivia não poderia ser mudada pela sua indignação ou ira social. Habacuque começa a perceber que a melhor coisa para mudar a sua realidade é a total dependência de Deus. O seu desejo é mudança, é um avivamento. E avivamento só pode ser produzido por Aquele quem pode conceder o dom da vida.

Com isso, o profeta muda sua postura de lamento, para uma postura de dependência. Habacuque vê que mudanças só podem ocorrer quando Deus, em sua soberania, atuar no meio de seu povo. O avivamento sempre é concedido por Deus, sem nenhuma obra meritória do homem.

Como no episódio do profeta Ezequiel e dos ossos secos (Ez 37). Enquanto o profeta contemplava o vale de ossos secos, Deus o interpela com seguinte pergunta, Filho do homem, esses ossos poderão reviver? Ezequiel responde dizendo que só Deus pode saber. Nesse episódio do livro do profeta Ezequiel os ossos só enchem-se de carne após ele dizer para ele ouvirem a voz de Deus (v.5). A vida só pode ser concedida por Deus e mais ninguém.

Talvez vivamos um momento habacuquiano, e nossos corações desejem ardentemente mudanças visíveis e reais no meio de nosso povo e em toda a nossa realidade social. Mas aprendemos com o profeta Habacuque que só a ação de Deus pode mudar a nossa realidade. Não são nossos talentos, não são nossas potencialidades e muito menos a nossa justiça. A verdadeira mudança só ocorrerá quando estivermos dispostos a depender inteiramente de Deus.

Para isso, devemos colocar a nossa arrogância de lado e clamar avidamente por uma ação divina no nosso meio. O avivamento é desejado, mas para caminhar para uma mudança real devemos depender de Deus.

2.    O avivamento evidência Deus e sua obra. (aviva sua obra Hb2.2b)

O avivamento que se inicia com a ação de Deus em meio a um povo rendido diante de seu amor, evidencia-se por meio da manifestação da obra de Deus.

O profeta Habacuque ao longo de suas lutas com Deus, apendeu que avivamento ou mudança da realidade de seu povo deveria ser marcada pela verdadeira obra de Deus e não por suas expectativas.

Habacuque quando questiona a Deus por todo mal ocorrido e deseja mudanças, ele queria que tais mudanças caminhassem de acordo com as suas ideias. Isso fica claro quando ele ao saber que os caldeus seriam instrumento de juízo, ele fica inconformado com Deus e o questiona novamente.

Com isso, o profeta aprende que mudanças, avivamentos, reformas divinas não são para satisfazer vontades humanas, mas para manifestar a obra de Deus.

Por isso, nessa oração em forma de hino, Habacuque não pede mais para Deus punir seu povo ou exterminar os caldeus, mas pede para que Deus evidencie as suas obras como Ele fez durante toda a história (como no êxodo, no Sinai e na conquista da terra v.3-15).

O avivamento é a manifestação da obra de Deus. O avivamento aponta para quem Deus é. Como o Evangelho de João bem destaca. Os milagres de Jesus não eram as suas obras. Os milagres ou sinais só apontavam para a verdadeira obra, que era sua vinda e vida (Jo 20.30-31).

Aprendemos com o com o profeta que o avivamento traz como evidencia a obra de Deus, os seus feitos, o seu poder, a sua pessoa, a salvação. Crescimento numérico, aumento do número de novas igrejas, aumento de campos missionários, Bíblia nas escolas, etc. Nada disso será evidência de avivamento se a obra de Deus não for o foco ou a evidência maior.

A maior obra de Deus, a maior evidência de avivamento é o sacrifício expiatória de Jesus Cristo. Se tudo aquilo que foi citado anteriormente não for fruto do Evangelho (salvação em Jesus), é só palha, é só placebo espiritual que nos engana, mas não traz cura para alma. O avivamento além de ser produzido por Deus, é a manifestação de sua obra e sua obra é Cristo.

3.    O avivamento é manifestação da misericórdia divina. (na tua ira, lembra-te da misericórdia Hb 2.2d).

O final do verso dois, o profeta pede para Deus lembrar no momento de sua ira, da misericórdia.

Outra coisa que o profeta Habacuque aprende ao longo de sua teodiceia é que o avivamento, mudança, renovação, reforma é fruto da misericórdia divina. Nós não temos instrumentos de barganha com Deus. O que merecemos é juízo e condenação.

O apostolo Paulo em Rm 1.18 fala, Pois a ira de Deus se revela do céu contra toda impiedade e injustiça dos homens, que impedem a verdade pela injustiça. Ou seja, todos somos merecedores da ira divina, mas Ele escolhe manifestar o seu amor em Jesus Cristo.

Por isso, todo o avivamento ou a salvação, pois estávamos mortos em delitos e em pecados (Ef 2.5). Para ser mais claro o texto de Efésios 2.4-5, diz: Mas Deus, que é rico em misericórdia, pelo seu imenso amor com que nos amou, estando nós ainda mortos em nossos pecados, deu-nos vida juntamente com Cristo (pela graça sois salvos).

Se somos agraciados pela misericórdia e amor de Deus demos também ser agentes da misericórdia. Os aviamentos são manifestação e aplicação da misericórdia de Deus.

Conclusão

Creio que todos nós desejamos um avivamento, todos nós esperamos por mudanças significativas sociais e eclesiasticamente falando. Mas somos convidados a lembrar, nessa reflexão do profeta Habacuque, que avivamento é uma ação misericordiosa de Deus que se evidencia por sua obra de salvação em Jesus.

Fontes de Pesquisa

  • BAKER, David Weston. Obadias, Naum, Habacuque, Sofonias. São Paulo: Vida Nova, 2001.
  • Bíblia Sagrada versão NVI
  • CARSON, D. A. Comentário bíblico: Vida Nova. São Paulo: Vida Nova, 2009.
  • DILLARD, Raymond B. Introdução ao Antigo Testamento. São Paulo: Vida Nova, 2006.
  • LOPES, Hernandes Dias. Habacuque: como transformar o desespero em cântico de vitória. São Paulo: Hagnos, 2007.
  • SAYÃO, Luiz. O problema do mal no antigo testamento: o caso de Habacuque. São Paulo: Hagnos, 2012.

Soli Deo gloria!

sábado, 20 de agosto de 2016

Habacuque 2

Habacuque 1.12 – 2.5
Introdução: Vimos na reflexão anterior que o profeta Habacuque tinha questionado a Deus pelo fato de haver muita impiedade e injustiça no meio do povo de Judá. A nação estava corrompida, todo o esforço do rei Josias em ter uma nação que buscasse a Deus estava sendo destruída pelo reinado e geração seguinte, o profeta não entendia como Deus estava deixando isso acontecer no meio de seu povo. O profeta Habacuque interpela Deus para que Ele manifeste seu juízo sobre Judá.
A resposta de Deus vem como um soco forte sobre o profeta. Deus certamente manifestaria o seu juízo. Os Babilônicos, uma nação cruel e idolatra, seria o seu instrumento de juízo sobre a nação de Judá. Os Caldeus estavam num frenesi de conquistas, conquistaram a Assíria, derrotaram o Egito e agora viriam para subjugar o povo de Judá. Ou seja, Deus não estava inerte em seu trono, a sua justiça e santidade seriam satisfeitas por meio de seu juízo.
Essa resposta não foi bem recebida pelo profeta, pois logo depois de recebe-la ele entra em crise e lança outra pergunta a Deus. Que basicamente é uma dúvida de como um Deus santo pode usar uma nação vil para punir o povo da aliança divina. Para Habacuque não fazia sentido algum o fato de uma nação mais ímpia que Judá ser o instrumento usado por Deus para puni-los.
A segunda pergunta de Habacuque também não fica sem resposta. Deus não estava cego para a impiedade e injustiça dos caldeus. A sua santidade e justiça exigem uma vida santa e justa de todos, e os que não responderem a santidade e justiça divinas certamente serão punidos pela sua desobediência. Nas palavras ditadas ao profeta, O ímpio está envaidecido; seus desejos não são bons; mas o justo viverá por sua fidelidade (Hb 2.4).
Mas vejamos a dúvida de Habacuque e a resposta de Deus mais de perto, para uma melhor compreensão do texto.
A segunda queixa de Habacuque (1.12 – 2.1). Após receber a sua primeira resposta, o profeta dirige outro salmo em forma de lamento a Deus, lamento por uma resposta que desmonta toda a teologia de Habacuque.
Habacuque começa a sua segunda queixa com uma pergunta retórica. Que tem como propósito evidenciar a eternidade de Deus. Essa eternidade mencionada é para mostrar que Ele é Deus real e verdadeiro que existe desde sempre e não um Deus subjetivo dos caldeus. Como pode a Rocha que é desde a eternidade ser derrotado pelo deus caldeu? (1.12)
O profeta continua seu lamento falando dos atributos de Deus, como a santidade e justiça (1.13). O profeta se refere a esses atributos pois para ele não é possível um Deus santo e justo utilizar um instrumento injusto para cumprir seus propósitos. Para Habacuque qualquer associação com o mal é pecado. Deus não poderia estar associado com uma nação como a babilônica. Para Habacuque não faz o menor sentido Deus usar uma nação mais impura que Israel para puni-los.
Nos versos seguintes (1.14-15), Habacuque expõe de forma metafórica a forma cruel que os babilônicos subjugavam as nações. Como peixes que são arrancados de seu ambiente, assim fariam os caldeus com o povo de Judá. O povo de Judá não seria simplesmente punido pela força dos caldeus, mas também arrancados de sua terra, da terra da promessa.
Próximo ao fim de seu lamento outra questão é levantada pelo profeta (1.16-17). A vitória da Babilônia causava outro problema teológico no pensamento de Habacuque. A derrota de Judá significaria a derrota de Deus. Pois na sua vitória, os caldeus cultuariam o seu deus e não Javé.
Depois de questionar Deus, Habacuque se coloca, como um militar, em sua torre de vigia aguardando Deus responder os seus questionamentos (2.1).
A resposta a queixa do profeta (2.2-5). Deus fala ao profeta, mas não responde diretamente seus questionamentos.
Quando Deus responde ao profeta Ele quer deixar claro que não é para satisfazer à vontade ou duvida do profeta, mas para deixar uma mensagem vivida e clara para todos (2.2). Uma mensagem que deve ser preservada e anunciada a todos. Uma mensagem com data determinada para acontecer (2.3), não se cumprirá por vontade humana, mas cumprirá os propósitos de Deus na história.
Essa mensagem evidencia o triunfo do justo sobre o injusto (2.4-5). O triunfo da fidelidade é contrastado com a agitação arrogante e a falta de realização daqueles que não dependem de Deus.
De forma dialética é apresentada a forma de viver do ímpio em comparação com a do justo. O ímpio está aprisionado por sua cobiça que nunca se satisfaz. Os seus desejos são sempre maus. Desejos esses que nunca conseguem ficar satisfeitos, pois são vorazes com a morte e a sepultura. Enquanto o justo vivi por sua fé ou fidelidade.
O texto continua descrevendo a punição que recairá sobre os ímpios, especialmente sobre os babilônicos, com os 5 aís de Deus.
Mas a partir da resposta dada por Deus a queixa de Habacuque vejamos algumas aplicações práticas extraídas do texto.
  1. Uma resposta a ansiedade.
Vemos no texto um profeta ansioso com a realidade de seu povo e com a resposta dura que ouviu de Deus. O fato de não estar alienado como vimos na última reflexão pode ter deixado o profeto tenso com a situação.
Habacuque estava aflito com a realidade de seu povo e mais aflito ficou quando descobriu que o povo ímpio da Babilônia seria o instrumento de juízo divino. Isso o deixou cheio de dúvidas e questões, até de ordem teológicas. Mas Deus em sua resposta traz uma mensagem de conforto e encorajamento ao profeta. Mesmo diante de um quadro difícil, Deus estava agindo e o pecado de ninguém escaparia de punição, nem Judá, nem Babilônia. O ímpio será punido por sua postura cruel. Deus não desamparou o profeta e nem o seu povo.
Mesmo que os momentos não sejam muito favoráveis e pareça que Deus nos abandonou ou que está assistindo tudo em seu trono sem interferir, Ele ainda está no controle de tudo.
Deus não nos abandona. Como Deus fala ao profeta Jeremias, "Sou eu apenas um Deus de perto", pergunta o Senhor, "e não também um Deus de longe? (Jeremias 23:23). Deus não é Deus apenas quando podemos senti-lo ou vemos a sua manifestação com clareza, ou ainda, quando tudo vai bem. Deus é Deus mesmo quando parece que Ele está distante, ou quando as coisas vão mal.
Deus não é um relojoeiro que criou o relógio e abandonou a sua própria sorte. Mas Ele criar, sustenta e governa a sua obra.
Com isso, somos convidados a confiar nele, mesmo que as respostas pareçam as mais absurdas, ou mesmo nos momentos mais difíceis. Deus nunca nos desampara. A nossa ansiedade de ser derrotada pelo fato de Deus ser o Senhor de nossas vidas, e como Senhor certamente ele está cuidando de nós.
  1. Deus não nos desempara, pois Ele é o Deus da História.
O Senhor mostra ao profeta que nada está fora de seu domínio e que Ele não foi pego de surpresa. Deus revela ao profeta que a sua mão continua a conduzir a História. Por mais que os babilônicos fossem uma nação cruel e derrotassem Judá, isso não faria de Deus um ente secundário na história. Deus é tão soberano na história que usaria a crueldade dos caldeus como instrumento para cumprir seus propósitos na nação de Judá.
Além disso, os caldeus também estavam sobre a sua soberania. Pois chegará um dia onde o reino eterno de Deus se manifestará. E sua mensagem não falhará. Essa mensagem que Deus fala para o profeta escrever não aponta simplesmente para a derrota dos babilônicos, mas também para era messiânica e o cumprimento escatológico da obra de redenção.
A História não é cíclica e fica dando voltas ininterruptamente. Também não é um caminhão desgovernado que desce ladeira abaixo sem controle. A História está nas mãos do nosso Senhor e Ele a conduzirá para o cumprimento de sua vontade.
Nós não somos filhos do acaso, somos filhos do Senhor da História. Por isso, devemos confiar no seu cuidado e na sua soberania. O nosso Senhor está com as rédeas da História na mão. O nosso Senhor não é apenas o Senhor das nossas vidas, mas o Senhor de toda a História. Por isso, os seus planos nunca serão frustrados.
  1. O Juízo é uma realidade.
Deus revela a Habacuque que Ele é um Deus que efetua a justiça. Esse Deus que está cuidando de seu povo, mesmo em momentos difíceis, esse que tem a rédea da história nas mãos, também é o Deus que fará sua justiça ser satisfeita.
O profeta recebe o oráculo divino de que a justiça divina será satisfeita. O profeta estava certo em sua teologia em crer em um Deus santo e justo, mesmo errado nas formas de Deus executar juízo e santidade.
Habacuque recebe um oráculo deque Deus executará sua justiça para ver sua santidade satisfeita. Não simplesmente com relação aos caldeus, mas a todos. Pois uma mensagem duradoura e visível deveria ser escrita (2.2-3).
A justiça de Deus e a sua santidade nunca serão negligenciadas, certamente serão satisfeitas. O nosso Senhor não é irresponsável ou injusto de vendar seus olhos para fingir não ver o pecado no meio do povo e com isso aceitar todos. Se fosse dessa forma o Senhor Jesus não precisaria vir para morrer em nosso lugar.
Somos lembrados que Deus fez e à de fazer justiça. Ele fez justiça em Cristo Jesus, fazendo dEle pecado em nosso lugar. E à de fazer naquele grande e terrível dia.
Essa mensagem deve ser escrita em letras garrafais para que todos vejam com clareza. Essa mensagem foi confiada a nós, o seu povo e nossa tarefa é faze-la conhecida de todos.
Devemos tomar a nossa responsabilidade de “profetas” de Deus e anunciar a justiça divina. A justiça realizada em Cristo e a justiça para aqueles que não se rendem ao seu senhorio.
  1. O justo vive por sua fé/fidelidade
Todo oráculo de Deus se concentra em um ponto, o justo vive por sua fé/fidelidade. Aquele que permanecerá mesmo diante das intemperes da realidade e mesmo diante do juízo divino será o justo.
Quando Deus responde a queixa do profeta, Ele faz uma comparação entre o ímpio e o justo, falando que o justo permaneceria e o ímpio pereceria, uma característica é evidenciada para que o nome de justo seja atribuído ao seu portador, a sua fé ou fidelidade.
No verso quatro o  termo traduzido por fé em algumas de nossas versões ou como fidelidade em outras, o correto de entender esse texto é a junção das duas palavras. Pois a fé para o hebreu se materializa na sua fidelidade a Deus. Aquele que tem fé, demostra sua fé por meio de uma fidelidade continua a seu Deus.
A fé autentica é como uma árvore bem plantada e cuidada que logo é reconhecida pelos seus frutos de fidelidade.
Fé aqui no texto, mesmo texto usado por Paulo em Romanos 1.17, não é uma mera crença vazia de significado, mas sim um compromisso autentico de exercitar essa fé seguindo a Deus, sendo obediente a Ele.
Nas palavras de Tiago, mas alguém dirá: "Você tem fé; eu tenho obras". Mostre-me a sua fé sem obras, e eu lhe mostrarei a minha fé pelas obras (Tg 2.18). A fé e a fidelidade sempre andam juntas. Não existe uma fé que não fica clara em uma vida que dá frutos de fidelidade.
Conclusão
Aprendemos com a luta do profeta Habacuque que não devemos ficar ansiosos com os momentos difíceis da vida ou pelo menos lutar contra eles, mesmo que o horizonte não mostre boas coisas. Pois servimos um Deus que é fiel com o seu povo e cuida dele; servimos um Deus que é o senhor da história, e os seus propósitos não serão frustrados. Servimos a um Deus santo e justo que fará justiça, e nos torna porta-vozes dessa mensagem. Mas o nosso serviço deve ser evidenciado em uma fé servil que produz frutos de fidelidade. Que o Senhor nos ajude em nossa caminhada.

Fontes de Pesquisa

  • BAKER, David Weston. Obadias, Naum, Habacuque, Sofonias. São Paulo: Vida Nova, 2001.
  • Bíblia Sagrada versão NVI
  • CARSON, D. A. Comentário bíblico: Vida Nova. São Paulo: Vida Nova, 2009.
  • DILLARD, Raymond B. Introdução ao Antigo Testamento. São Paulo: Vida Nova, 2006.
  • LOPES, Hernandes Dias. Habacuque: como transformar o desespero em cântico de vitória. São Paulo: Hagnos, 2007.
  • SAYÃO, Luiz. O problema do mal no antigo testamento: o caso de Habacuque. São Paulo: Hagnos, 2012.
Soli Deo gloria!


sábado, 6 de agosto de 2016

Habacuque 1

Habacuque 1.1-11.
Contexto histórico.
O período que o profeta Habacuque redigiu os seus oráculos foi em algum momento entre os anos de 625 e 604 a.C., momento que os caldeus (babilônicos) estavam em ascensão. Até o grande império Assírio estava se curvando diante do poderio caldeu. Segundo Dillard (2006, p.393), “em 604 a.C., os exércitos babilônicos subjugaram a cidade-estado dos remanescentes do outrora grande Império Assírio”.
Depois de subjugar a Assíria, os babilônicos voltaram a sua atenção para Judá. Em 598 a.C., Nabucodonosor invadiu a primeira vez o reino de Judá e levou cativo o rei Joaquim e a família real para o exílio. Foi nesse evento que o profeta Daniel e seus amigos foram para a Babilônia. Há indícios que Habacuque foi contemporâneo de outros profetas como, Jeremias, Sofonias, Naum e talvez Joel.
O texto.
O problema da impiedade sem punição (2-4). Após uma breve apresentação no verso 1 do livro, o profeta dirige a sua insatisfação para Deus. Em forma de lamento o profeta questiona a Deus de como os ímpios prosperam, enquanto os justos são devorados. Os injustos aqui não são pessoas fora do povo de Judá, como os assírios ou os babilônios, mas é a própria nação de Judá.
Um povo injusto (v.3), que não leva em conta a orientação da Lei. Transgredi-la não é nenhum problema. Mas a Lei não é só transgredida, é torcida também (v.4). Os injustos não somente descumprem a Lei, mas a diluem para dar legalidade ao seu ato pecaminoso. E Lei (Torah) aqui, deve ser compreendida não somente com conjunto de regras legais, mas como revelação de Deus aos homens.
A nação de Judá havia experimentado um avivamento com o reinado de Josias (627 a.C.), ao longo do tempo esse despertamento começou a perder força e algumas pessoas da nação começaram a voltar as antigas práticas pecaminosas, incluindo a idolatria.
Habacuque em seu clamor em forma de lamento, anuncia a perversidade de uma nação violenta. Um povo que oprime os seus próprios conterrâneos. O sofrimento de o povo sentia não vinha dos de fora, mas dos de dentro. É como se a própria igreja oprimisse a sua membresia.
Habacuque também denuncia a injustiça. O conflito e a luta estão sempre diante de seus olhos. Não há paz na nação de Judá. Há sempre conflitos no meio do povo, e em tais conflitos a justiça não é realizada, os injustos prevalecem contra os justos. Só que quando os injustos prevalecem contra os justos a lei enfraquece.
Em uma nação teocrática como Judá, falar que a Lei está fraca pode não ser o mesmo que falar literalmente que a Lei como revelação foi deixada de lado, mas em algum nível é o que acontece. Pois a legislação de Judá é reflexo da Lei revelacional de Deus ao seu povo. Ela deveria ser o princípio fundamental para orientar tudo na nação. Então, quando profeta fala que enfraquece ou é torcida, em sua gênese houve negligência com a Palavra de Deus.
Esse é o quadro do povo de Judá que o profeta Habacuque estava denunciando. Não só denunciando, pedindo a intervenção de Deus, para que o quadro deprimente da nação fosse alterado. Mas a resposta de Deus não foi muito palatável para o profeta.
Deus responde o profeta de forma inesperada (v.5-11). Deus está ciente da impunidade e infidelidade de seu povo. Como Deus justo, Ele decide fazer justiça e punir os ímpios por seus pecados. A resposta que o Senhor dá ao profeta não o anima muito. Na verdade, o deixa mais confuso ou indignado ainda.
A reposta que Deus dá a Habacuque é a seguinte. Estou trazendo os babilônicos para punir vocês por seus pecados. Aquela nação vil e cruel para marchar sobre vocês. Ou seja, uma nação conhecida por sua ferocidade, sua sede de sangue, por sua arrogância, que menosprezam reis e governantes, será o instrumento de juízo de Deus.
Os caldeus estavam assombrando o mundo conhecido de sua época. A poderosa Assíria que havia levado o Reino do Norte cativo tinha sucumbido diante dos caldeus. Nem o Egito, que se aliou com os assírios, conseguiu frear a poderosa Babilônia. As nações estavam pasmas com a força e a rapidez da acessão dessa nação. E, é ela que viria com força para punir o povo infiel e impiedoso de Judá.
Este é o quadro que se depara o profeta Habacuque. Residindo em meio a um povo injusto e infiel. Quando clama a Deus por socorro, recebe de Deus a resposta de que um povo pior do que os seus compatriotas seria instrumento de juízo divino sobre eles. O profeta fica sem compreender os propósitos de Deus, o que o faz a fazer outra pergunta para Deus. Mas isso é parte de outra reflexão. Vejamos o que de ensino prático podemos extrair desse texto.

1.    Só podemos ser instrumentos de Deus quando estamos sensíveis a realidade que nos cerca.
   Habacuque não era um alienado. A primeira coisa que aprendemos com o profeta Habacuque é estar sensível a realidade que nos cerca. O profeta não ficou no seu oficio ou seu emprego e não se preocupou com a realidade de seu povo. Ele não ia da casa para o trabalho e do trabalho para casa sem notar o verdadeiro quadro de sua nação.
A alienação da realidade é um mal da nossa sociedade contemporânea. A nossa sociedade egocêntrica nos ensina a olhar para o nosso mundinho particular somente. Compadecer-se dos outros é perda de tempo. Enquanto estou estivermos olhando para nós mesmo o tempo todo, nós não conseguiremos ser instrumentos de Deus para ninguém. Enquanto os nossos interesses forem prioridades, nunca sermos resposta de oração de ninguém. O profeta Habacuque só chegou ao ponto de questionar a Deus porque ele parou de olhar para dentro e começou a olhar para fora. O Senhor Jesus só se compadeceu das pessoas porque ele veio par servir e não para ser servido e muito menos para servir-se.
    Lembro-me do livro pequeno príncipe de Antonie de Saint-Exupéry. Quando o pequeno príncipe começa a visitar os asteroides que estavam próximos a ele, o primeiro tinha um rei. Um rei que vivia sozinho um seu mundinho e achava que tudo girava em torno dele e que todos eram seus súditos, até as estrela e sol.
    Enquanto o nosso olhar estiver preocupado com o nosso mundinho particular, com nosso "reinado egocêntrico", nós nunca impactaremos a sociedade que nos cerca.
2.    O momento do sofrimento é o momento predileto de Deus revelar sua vontade.
  Se o momento que Habacuque não fosse um momento crítico ou de sofrimento, Habacuque não teria ria recebido o oráculo de Deus. Há muitos textos da Bíblia que indicam essa verdade de que Deus se manifesta em meio as dificuldades e sofrimentos. Meus irmãos, considerem motivo de grande alegria o fato de passarem por diversas provações, pois vocês sabem que a prova da sua fé produz perseverança (Tiago 1:2-3). De fato, todos os que desejam viver piedosamente em Cristo Jesus serão perseguidos (2 Timóteo 3:12).
Por mais que não seja agradável passar por momentos difíceis, muitas das vezes é esse é o caminho que Deus usa para revelar sua vontade a nós. Isaías foi cerrado ao meio, Jeremias ficou preso em uma cisterna, Daniel foi parar na cova dos leões, Paulo foi diversas vezes preso e espancado, o nosso Senhor Jesus sofreu para nos dar vida.
    Às vezes é em meio ao sofrimento que Deus se revela a nós de maneira mais palpável. Isso fica claro quando vemos que as nações mais ateias são as que menos passam por momentos difíceis.
   É como se o deserto fosse o meio pedagógico de Deus. Pois é no deserto que toda a arrogância é desmantelada, é no deserto que o nosso orgulho se desfaz, é no deserto que precisamos exercitar a humildade. E é aos humildes que Deus se revela. É aos de coração contrito que ele ampara e socorre.
3.    As respostas de Deus nem sempre são as desejadas.
   A terceira lição que aprendemos com o profeta Habacuque é que Deus não responde aos nossos caprichos ou como desejamos. O profeta queria justiça, mas justiça ao seu modo. E quando Deus responde o profeta fica pasmo. Deus responde de acordo com os seus propósitos e vontade, e não para satisfazer nossas vontades.
  A nossa sociedade mercadológica e de consumo está acostumada a pegar as coisas na prateleira do mercado ou a trocar de canal quando não está satisfeita com o que está vendo. Só que Deus não encalha nessa ideologia mimada de controle remoto. Não há nenhum botão em Deus para fazê-lo mudar de direção ou mudar sua forma de agir a fim de satisfazer os nossos desejos. É como Tiago diz, Quando pedem, não recebem, pois pedem por motivos errados, para gastar em seus prazeres (Tiago 4.3).
  Deus não é aquele pai irresponsável e sem autoridade que o filho pega o que quer na prateleira do mercado e o pai se rende aos seus caprichos. Deus é um pai sábio que dará aos seus filhos o que realmente eles precisam para se tornarem adultos maduros. E isso, deve ser um motivo de grande alegria. Pois como crianças que não compreendem a real necessidade de nossas vidas, devemos descasar em um Pai soberano que sabe o que é o melhor para nós.


Soli Deo gloria!

Fontes de Pesquisa
  • BAKER, David Weston. Obadias, Naum, Habacuque, Sofonias. São Paulo: Vida Nova, 2001.
  • Bíblia Sagrada versão NVI
  • DILLARD, Raymond B. Introdução ao Antigo Testamento. São Paulo: Vida Nova, 2006.
  • LOPES, Hernandes Dias. Habacuque: como transformar o desespero em cântico de vitória. São Paulo: Hagnos, 2007.
  • SAINT-EXUPÉRY, Antonie. O pequeno príncipe. São Paulo: Giz Editorial, 2015.
  • SAYÃO, Luiz. O problema do mal no antigo testamento: o caso de Habacuque. São Paulo: Hagnos, 2012.