Habacuque 1.1-11.
Contexto histórico.
O
período que o profeta Habacuque redigiu os seus oráculos foi em algum momento
entre os anos de 625 e 604 a.C., momento que os caldeus (babilônicos) estavam
em ascensão. Até o grande império Assírio estava se curvando diante do poderio
caldeu. Segundo Dillard (2006, p.393), “em 604 a.C., os exércitos babilônicos
subjugaram a cidade-estado dos remanescentes do outrora grande Império Assírio”.
Depois
de subjugar a Assíria, os babilônicos voltaram a sua atenção para Judá. Em 598
a.C., Nabucodonosor invadiu a primeira vez o reino de Judá e levou cativo o rei
Joaquim e a família real para o exílio. Foi nesse evento que o profeta Daniel e
seus amigos foram para a Babilônia. Há indícios que Habacuque foi contemporâneo
de outros profetas como, Jeremias, Sofonias, Naum e talvez Joel.
O texto.
O problema da impiedade sem punição (2-4). Após
uma breve apresentação no verso 1 do livro, o profeta dirige a sua insatisfação
para Deus. Em forma de lamento o profeta questiona a Deus de como os ímpios
prosperam, enquanto os justos são devorados. Os injustos aqui não são pessoas
fora do povo de Judá, como os assírios ou os babilônios, mas é a própria nação
de Judá.
Um
povo injusto (v.3), que não leva em conta a orientação da Lei. Transgredi-la
não é nenhum problema. Mas a Lei não é só transgredida, é torcida também (v.4).
Os injustos não somente descumprem a Lei, mas a diluem para dar legalidade ao
seu ato pecaminoso. E Lei (Torah)
aqui, deve ser compreendida não somente com conjunto de regras legais, mas como
revelação de Deus aos homens.
A
nação de Judá havia experimentado um avivamento com o reinado de Josias (627
a.C.), ao longo do tempo esse despertamento começou a perder força e algumas
pessoas da nação começaram a voltar as antigas práticas pecaminosas, incluindo
a idolatria.
Habacuque em seu clamor em
forma de lamento, anuncia a perversidade de uma nação violenta. Um povo que
oprime os seus próprios conterrâneos. O sofrimento de o povo sentia não vinha
dos de fora, mas dos de dentro. É como se a própria igreja oprimisse a sua
membresia.
Habacuque
também denuncia a injustiça. O conflito e a luta estão sempre diante de seus
olhos. Não há paz na nação de Judá. Há sempre conflitos no meio do povo, e em
tais conflitos a justiça não é realizada, os injustos prevalecem contra os
justos. Só que quando os injustos prevalecem contra os justos a lei enfraquece.
Em uma
nação teocrática como Judá, falar que a Lei está fraca pode não ser o mesmo que
falar literalmente que a Lei como revelação foi deixada de lado, mas em algum
nível é o que acontece. Pois a legislação de Judá é reflexo da Lei revelacional
de Deus ao seu povo. Ela deveria ser o princípio fundamental para orientar tudo
na nação. Então, quando profeta fala que enfraquece ou é torcida, em sua gênese
houve negligência com a Palavra de Deus.
Esse é
o quadro do povo de Judá que o profeta Habacuque estava denunciando. Não só
denunciando, pedindo a intervenção de Deus, para que o quadro deprimente da
nação fosse alterado. Mas a resposta de Deus não foi muito palatável para o
profeta.
Deus responde o profeta de forma inesperada (v.5-11). Deus
está ciente da impunidade e infidelidade de seu povo. Como Deus justo, Ele
decide fazer justiça e punir os ímpios por seus pecados. A resposta que o
Senhor dá ao profeta não o anima muito. Na verdade, o deixa mais confuso ou
indignado ainda.
A
reposta que Deus dá a Habacuque é a seguinte. Estou trazendo os babilônicos
para punir vocês por seus pecados. Aquela nação vil e cruel para marchar sobre
vocês. Ou seja, uma nação conhecida por sua ferocidade, sua sede de sangue, por
sua arrogância, que menosprezam reis e governantes, será o instrumento de juízo
de Deus.
Os
caldeus estavam assombrando o mundo conhecido de sua época. A poderosa Assíria
que havia levado o Reino do Norte cativo tinha sucumbido diante dos caldeus.
Nem o Egito, que se aliou com os assírios, conseguiu frear a poderosa
Babilônia. As nações estavam pasmas com a força e a rapidez da acessão dessa
nação. E, é ela que viria com força para punir o povo infiel e impiedoso de
Judá.
Este é
o quadro que se depara o profeta Habacuque. Residindo em meio a um povo injusto
e infiel. Quando clama a Deus por socorro, recebe de Deus a resposta de que um
povo pior do que os seus compatriotas seria instrumento de juízo divino sobre
eles. O profeta fica sem compreender os propósitos de Deus, o que o faz a fazer
outra pergunta para Deus. Mas isso é parte de outra reflexão. Vejamos o que de
ensino prático podemos extrair desse texto.
1. Só podemos ser instrumentos de Deus quando
estamos sensíveis a realidade que nos cerca.
Habacuque não era um alienado. A primeira coisa
que aprendemos com o profeta Habacuque é estar sensível a realidade que nos
cerca. O profeta não ficou no seu oficio ou seu emprego e não se preocupou com
a realidade de seu povo. Ele não ia da casa para o trabalho e do trabalho para
casa sem notar o verdadeiro quadro de sua nação.
A alienação da realidade é um mal da nossa sociedade contemporânea. A
nossa sociedade egocêntrica nos ensina a olhar para o nosso mundinho particular
somente. Compadecer-se dos outros é perda de tempo. Enquanto estou estivermos
olhando para nós mesmo o tempo todo, nós não conseguiremos ser instrumentos de
Deus para ninguém. Enquanto os nossos interesses forem prioridades, nunca
sermos resposta de oração de ninguém. O profeta Habacuque só chegou ao ponto de
questionar a Deus porque ele parou de olhar para dentro e começou a olhar para
fora. O Senhor Jesus só se compadeceu das pessoas porque ele veio par servir e
não para ser servido e muito menos para servir-se.
Lembro-me do livro pequeno príncipe de
Antonie de Saint-Exupéry. Quando o pequeno príncipe começa a visitar os
asteroides que estavam próximos a ele, o primeiro tinha um rei. Um rei que
vivia sozinho um seu mundinho e achava que tudo girava em torno dele e que
todos eram seus súditos, até as estrela e sol.
Enquanto o nosso olhar estiver preocupado com o nosso mundinho particular, com nosso "reinado egocêntrico", nós nunca impactaremos a sociedade que nos cerca.
2. O momento do sofrimento é o momento predileto
de Deus revelar sua vontade.
Se o momento que Habacuque não fosse um
momento crítico ou de sofrimento, Habacuque não teria ria recebido o oráculo de
Deus. Há muitos textos da Bíblia que indicam essa verdade de que Deus se
manifesta em meio as dificuldades e sofrimentos. Meus irmãos, considerem motivo de grande alegria o fato de passarem por
diversas provações, pois vocês sabem que a prova da sua fé produz perseverança (Tiago
1:2-3). De fato, todos os que desejam
viver piedosamente em Cristo Jesus serão perseguidos (2 Timóteo 3:12).
Por mais que não
seja agradável passar por momentos difíceis, muitas das vezes é esse é o
caminho que Deus usa para revelar sua vontade a nós. Isaías foi cerrado ao meio,
Jeremias ficou preso em uma cisterna, Daniel foi parar na cova dos leões, Paulo
foi diversas vezes preso e espancado, o nosso Senhor Jesus sofreu para nos dar
vida.
Às vezes é em meio
ao sofrimento que Deus se revela a nós de maneira mais palpável. Isso fica
claro quando vemos que as nações mais ateias são as que menos passam por
momentos difíceis.
É como se o deserto fosse o meio pedagógico
de Deus. Pois é no deserto que toda a arrogância é desmantelada, é no deserto
que o nosso orgulho se desfaz, é no deserto que precisamos exercitar a
humildade. E é aos humildes que Deus se revela. É aos de coração contrito que
ele ampara e socorre.
3. As respostas de Deus nem sempre são as
desejadas.
A terceira lição que aprendemos com o
profeta Habacuque é que Deus não responde aos nossos caprichos ou como
desejamos. O profeta queria justiça, mas justiça ao seu modo. E quando Deus responde
o profeta fica pasmo. Deus responde de acordo com os seus propósitos e vontade,
e não para satisfazer nossas vontades.
A nossa sociedade
mercadológica e de consumo está acostumada a pegar as coisas na prateleira do
mercado ou a trocar de canal quando não está satisfeita com o que está vendo.
Só que Deus não encalha nessa ideologia mimada de controle remoto. Não há
nenhum botão em Deus para fazê-lo mudar de direção ou mudar sua forma de agir a
fim de satisfazer os nossos desejos. É como Tiago diz, Quando pedem, não recebem, pois pedem por motivos errados, para gastar
em seus prazeres (Tiago 4.3).
Deus não é aquele pai irresponsável e sem
autoridade que o filho pega o que quer na prateleira do mercado e o pai se
rende aos seus caprichos. Deus é um pai sábio
que dará aos seus filhos o que realmente eles precisam para se tornarem adultos
maduros. E isso, deve ser um motivo de grande alegria. Pois como crianças que
não compreendem a real necessidade de nossas vidas, devemos descasar em um Pai
soberano que sabe o que é o melhor para nós.
Soli Deo gloria!
Fontes de Pesquisa
- BAKER, David Weston. Obadias, Naum, Habacuque, Sofonias. São Paulo: Vida Nova, 2001.
- Bíblia Sagrada versão NVI
- DILLARD, Raymond B. Introdução ao Antigo Testamento. São Paulo: Vida Nova, 2006.
- LOPES, Hernandes Dias. Habacuque: como transformar o desespero em cântico de vitória. São Paulo: Hagnos, 2007.
- SAINT-EXUPÉRY, Antonie. O pequeno príncipe. São Paulo: Giz Editorial, 2015.
- SAYÃO, Luiz. O problema do mal no antigo testamento: o caso de Habacuque. São Paulo: Hagnos, 2012.
Nenhum comentário:
Postar um comentário