Introdução ao Novo Testamento
O Novo Testamento é composto por 27 livros inspirados por Deus, que
foram escritos em um período de aproximadamente 50 anos. Esse estudo pretende
fazer uma breve introdução ao estudo desse conjunto de livros, estudando o contexto
politico, histórico, social e religioso da época tendo em vista uma melhor
abordagem interpretativa do livro.
Contexto Histórico e Político.
O Novo Testamento foi escrito num período muito significativo da
história antiga, período do poderoso império romano. O império era dividido em
províncias, que por muitas das vezes eram governadas por pessoas da própria
região. É o caso da Palestina, que estava sob o comando de Herodes, o Grande,
que governou de 37 a 4 a.C., que segundo Gundry (2008, p. 40), era um
“indivíduo astuto, invejoso e cruel, Herodes assassinou duas de suas esposas e
pelo menos três de seus próprios filhos”. Mas apesar de sua crueldade, ele era
um hábil governador, que tanto sabia agradar a Roma, quanto seus súditos.
Mas a habilidade governamental não continuou com seus filhos, e seu
governo foi divido entre eles. Arquelau ficou governado a Judéia, Samaria e
Iduméia, que no futuro, devido a revoltas locais, perdeu seu trono para um
governador romano, Pilatos, que teve papel central no julgamento de Jesus;
Herodes Filipe ficou com a Ituréia, Traconite, Gaulanite, Auranite e Batanéia;
e Herodes Antipas na Galiléia e na Peréia. É Herodes Antipas que tem mais
destaque nos Evangelhos, pois foi ele que João Batista repreendeu por casar com
a mulher de seu irmão (Lc 3.19), foi ele quem matou João Batista depois de
seduzido pela filha de Herodias (Mt 14.6-10), foi ele que Jesus chamou de
“raposa” (Lc 13.32), e foi a ele que Pilatos envia Jesus para ser julgado, mas
ele mando-o de volta a Pilatos (Lc 23.7-11).
Depois do período em que ocorrem as narrativas dos Evangelhos,
outro fato histórico importante no período do Novo Testamento é a destruição de
Jerusalém.
O povo judeu sempre esteve em tensão com o governo romano, devido
principalmente pela religião politeísta romana e as altas taxas de impostos.
Quando o governador da Judeia Gessius Florus espoliou o tesouro do Templo, isso
foi a “gota d’agua” para o início da revolta, que durou de 66-74 d.C.. O
general Vespasiano fica encarregado de dar fim a revolta, mas como hábil
comandante ele dominou os arredores da cidade e aguardou um momento oportuno
para marchar sobre Jerusalém. Mas antes de Vespasiano entrar na cidade ele
retorna a Roma para assumir o império no lugar Nero, que havia se suicidado.
Seu filho, o general Tito, ficou com a tarefa de resolver o conflito. No ano 70
d.C., Tito invade a cidade e destrói o templo, não deixando pedra sobre pedra,
como Jesus havia profetizado (Mt 24.2; Lc 21.6).
O que restou dos revoltosos fugiu para Massada, uma fortaleza
construída por Herodes, o Grande. Depois de muita resistência os revoltosos
sucumbem, como narra Moretti, citando Flávio Josefo (p. 46):
Não havendo saída, o líder Eleazar Bem Yair, chamou seus fiéis
soldados e discursou: “Antes morrer do que ser escravizados por inimigos.
Livres, deixaremos este mundo”. Durante a noite, 960 homens, mulheres e
crianças deram cabo de suas vidas. Num abraço derradeiro, pais de família
matavam esposas e filhos afio de espada. Após o que, dez homens foram
escolhidos por sorteio para chacinar seus bravos companheiros de luta. O último
soldado pôs fogo no palácio e matou-se com a própria espada.¹
Com o fim da revolta, cessou também os sacrifícios, pois não existe
mais Templo. Outra revolta tenta ganhar corpo no ano de 135 d.C., logo sendo
abafada pelo império romano. Com isso, chega ao fim qualquer ideia de um estado
judaico.
Cenário religioso.
O cenário religioso do Novo Testamento é bastante sincrético. Havia
a religiosidade greco/romana, que era composta por inúmeros deuses. E cada
cidade romana tinha um deus, era uma espécie de “padroeiro” local. Um exemplo
disso era a cidade de Corinto, cidade que o apostolo Paulo endereça duas de
suas cartas, que tinha como religião principal a adoração a deusa Afrodite,²
deusa da sexualidade.
Mas apesar da sociedade romana ter os seus meios de culto e seus
deuses, eles não impediam os povos dominados de manterem suas práticas
religiosas. A única coisa que era proibido, era o surgimento de uma nova
religião. O cristianismo não foi perseguido em seu nascimento, porque
acreditava-se que era mais uma forma de ramificação do judaísmo. Quando o
governo percebeu que tratava-se de uma nova religião o cristianismo começou a
ser perseguido.
Essas ramificações do judaísmo são de interesse para o estudante do
Novo Testamento, pois muitas delas são mencionadas nos Evangelhos. Os
principais partidos do judaísmo podem ser divididos em: Saduceus, Zelotes, Essênios,
Herodianos e Fariseus.
Saduceus – Este era o grupo da nobreza judaica. Era um grupo que
tinha o controle do Templo e do Sinédrio Judaico (tribunal encarregado das
questões da religião judaica). Eram fundamentalista com relação a Lei, sendo
extremamente literais quanto a letra da Lei. O sumo sacerdote era sempre o
líder deste grupo.³ Quanto as suas crenças, Gundry nos diz: “Não acreditavam na
preordenação divina, em anjos, em espíritos, na imortalidade da alma e na
ressurreição”.
Zelotes – Eram um grupo de revolucionários que tinham o seu
interesse na independência da nação judaica. Foram os zelotes os principais
lideres da revolta contra o governador Florus, que havia roubado o Templo.
Revolta essa que termina com a destruição do Templo e a morte de milhares de
judeus, como citado anteriormente. Pelo menos um dos apóstolos foi zelote,
Simão, o zelote (Lc. 6.15). A visão que esse grupo tinha do messias, era a de
um grande guerreiro como foi o rei Davi. Provavelmente foi esse grupo que
tentou fazer Jesus rei (Jo 6.10-15). E uma das perguntas de Pilatos a Jesus era
se Ele era o rei dos judeus (Lc 23.3).
Essênios – Era um grupo extremamente conservador e observador da
lei judaica. Por acreditarem que a sociedade da época estava corrompida, o
grupo se retirou para formar comunidades monásticas até o retorno do messias.
Viviam de uma maneira muito simples, próximo ao Mar Morto. Alguns eruditos
acreditam que os manuscritos de Cunrã fazia parte da biblioteca desse grupo.
Herodianos – Era um grupo muito influente na Galileia e redondezas.
Tratava-se de judeus que defendiam a dinastia dos Herodes. Segundo Hale (2001,
p.20), “eles baseavam suas esperanças nacionais nessa família e olhavam para
ela com respeito ao cumprimento das profecias acerca do Messias”. No Evangelho
de Marcos eles conspiram com os fariseus para matarem Jesus (Mc 3.6).
Fariseus – Era o grupo mais destacado daquele tempo. Também o grupo
que mais é mencionado nos escritos do Novo Testamento. O seu surgimento é
incerto, mas a maioria dos estudiosos defendem que os fariseus são um
desdobramento do movimento hasidin (grupo piedoso do 2º século a.C), que teve
seu início com Esdras. Em essência, era um grupo separatista e exclusivista judaico
(só judeus era o povo de Deus), leal a tradição dos pais e a tradição oral,
diferentemente dos saduceus, literalistas. Foram muito resistentes com a
helenização da cultura judaica, mantendo vivo a língua hebraica e os costumes
ligados a tradição bíblica.
Os fariseus também foram os grandes teólogos de seu tempo. Tendo em
vista a manutenção da tradição dos pais, eles estudavam as Escrituras (Antigo
Testamento) para encontrar respostas para as influência das novas religiões
greco/romanas. Foi nesse período que temas como: anjos, ressurreição, demônios
e esperança messiânica foram desenvolvidos.
Eles controlavam as sinagogas e as interpretações bíblicas de sua
época. E devido a tal influência e interpretações extremamente rígidas, muitos
judeus eram oprimidos por tais lideres. Esses fardos pesados que os fariseus
colocavam sobre o povo foi duramente criticado por Jesus (Mt 23.4).
Vale também destacar que de todos esses grupos, os fariseus foi o único
grupo que sobreviveu a guerra judaico/romana. Mantendo assim um remanescente da
cultura judaica.
Cânon do Novo Testamento.
O conjunto de livros que forma o Novo Testamento não caiu do céu no
formato que tem hoje nas Bíblias. Eles foram um processo histórico que levou
alguns anos para ser estabelecidos como canônicos. Como diz Hale (2001, p. 29),
“quando Paulo escreve a Timóteo, dizendo que “toda Escritura é divinamente
inspirada...” (II Tim. 3.16), ele não tinha em mente o nosso Novo Testamento”.
Muitos outros escritos do primeiro século concorreram para serem
considerados inspirados por Deus. Mas, por que foram descartados e os atuais
não? Qual era o critério para avaliar cada livro?
Esses tipos de perguntas não foram feitas pela igreja primitiva no
início de sua caminhada. Livros como o Pastor de Hermas, 1ª Clemente, a Didaqué
e outros eram lidos pela igreja primitiva. Mas as perguntas só começaram a ser
feitas com o surgimento das heresias e das perseguições. Das heresias, pois
para defender a fé os pais da igreja precisavam de uma “régua de medir”
(Canôn). E as perseguições, pois por quais livros valia realmente morrer.
Com isso alguns critérios foram analisados para que um livro fosse
considerado canônico. Os critérios eram:
A apostolicidade dos escritos – Os escritos deveriam vir de um
apostolo de maneira direta (Evangelho de João, cartas paulinas), ou indireta
(Evangelho de Marcos, que é por muitos o “Evangelho do Apostolo Pedro”, por ter
sido um grande influenciador da vida de Marcos).
Conteúdo – O seu conteúdo deveria estar em conformidade com toda a
narrativa da salvação. O seu conteúdo espiritual é confiável?
Utilidade nas comunidades – O escrito deveria ser aceito nas
comunidades e as mesmas, deveriam testemunhar o valor profético desses livros.
¹
MORETTI, Fernando. Massada, a fortaleza de Herodes, o grande. Revista Guia de
História Especial, São Paulo, pags. 46-48.
²
HALE, Broadus David. Introdução ao estudo no Novo Testamento. Pag. 223.
³ Idem,
p. 19.
BIBLIOGRAFIA
·
GUNDRY,
Robert H. Panorama do Novo Testamento. São Paulo: Vida Nova, 2008.
·
HALE,
Broadus David. Introdução ao estudo no Novo Testamento.
·
MORETTI,
Fernando. Massada, a fortaleza de Herodes, o grande. Revista Guia de História
Especial, São Paulo: Hagnos, 2001.